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Dia Internacional da Visibilidade Trans

Uma equipa de investigadoras do Iscte-Instituto Universitário de Lisboa e da Universidade de Lisboa mapeou a investigação sobre pessoas transgénero e de género diverso (TGGD) em Portugal. Os resultados demonstram um crescente interesse no estudo das experiências e bem-estar de pessoas TGGD na última década, sobretudo nas ciências sociais.

© 2018 Cecilie Johnsen | Unsplash


Uma revisão de literatura procurou identificar a natureza e extensão da investigação sobre pessoas TGGD em Portugal e contribuir para mapear as rápidas mudanças sociais, médicas, e panorama político das questões trans em Portugal. Carla Moleiro, investigadora no Centro de Investigação e Intervenção Social (CIS-Iscte) e primeira autora deste estudo, explica que “podemos dizer que a investigação em Portugal está no seu início, mas existe já uma grande diversidade de temas investigados e de múltiplas perspetivas disciplinares”. Neste trabalho, os 48 estudos que cumpriram os critérios de inclusão foram agregados de acordo com as dimensões que investigavam. “O tema mais frequente prende-se com as trajetórias de género e identidades”, afirma a investigadora, e acrescenta que “as intervenções de afirmação de género foram abordadas sobretudo em estudos das ciências médicas e da saúde”. Também o sofrimento psicológico, o estigma e a discriminação, o enquadramento social e legal foram tópicos explorados na investigação em Portugal.


As investigadoras Violeta Alarcão (Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Iscte; Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa; Instituto de Saúde Ambiental) e Lia Raquel Neves (Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa) são coautoras deste “mapa” publicado na revista científica Journal of Gender Studies. Este trabalho identifica lacunas na investigação realizada até ao presente, informa a investigação futura e abre portas ao desenvolvimento de novos modelos conceptuais, refletindo sobre o reconhecimento de pessoas TGGD como agentes sociais com papel indispensável na investigação.


Em Portugal, é possível a autodeterminação da identidade de género desde 2018. O impacto social de estudos com abordagens multidisciplinares e que considerem a interseccionalidade ajudará na integração dos direitos humanos no combate à marginalização, discriminação e desigualdades de que esta comunidade é alvo. Efetivamente, Carla Moleiro salienta: “a maior parte dos estudos tem-se focado no sofrimento e nos desafios experienciados pelas pessoas TGGD”, e acrescenta que a sua equipa de investigação tem mostrado também interesse em explorar a resiliência das pessoas TGGD face a estas experiências negativas de estigma e discriminação.


A este propósito, num estudo realizado no âmbito de uma rede internacional coordenada por Alain Giami (Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale, França), Carla Moleiro e Violeta Alarcão caracterizaram a heterogeneidade desta comunidade em Portugal, do ponto de vista da forma diversa como se identificam, das trajetórias de afirmação social, legal e médica que percorrem, e no que se refere ao seu estatuto parental e desejo de parentalidade. Da amostra de 115 participantes, a maior parte relatou viver de acordo com a sua identidade de género em quase todos os contextos da sua vida. Apesar de relatar alguns antecedentes de abuso/violência e discriminação, a maioria das pessoas participantes tinha concluído o ensino secundário ou educação universitária, e metade tinha uma relação significativa ou vivia com um/a parceiro/a. Cerca de 10% das pessoas inquiridas tinha filhos/filhas e 20% demonstrou interesse em ter filhos/filhas. As autoras esclarecem que “estes resultados indicam que, apesar de estarem desproporcionalmente expostas a experiências de discriminação e violência, estas pessoas apresentam uma extraordinária resiliência, em que os processos de afirmação da identidade social e legal de género podem funcionar como fatores protetores”. De acordo com a equipa de investigação, as pessoas que participaram no estudo parecem estar a atingir objetivos de vida valorizados, tais como a educação, as relações íntimas e as aspirações familiares.


Também um outro estudo orientado por Carla Moleiro procurou compreender as experiências de famílias de jovens TGGD com o objetivo de documentar as vivências e desafios que os seus pais/mães, irmãos/irmãs e outros familiares. Neste trabalho desenvolvido por Maria João Carmona, Nuno Pinto e Carla Moleiro, foi possível descrever as perspetivas das famílias de jovens TGGD relativamente aos seus papéis e relações (inter)familiares, incluindo o processo de coming out, mas também compreender a relação da família nuclear com a família alargada, o sistema educativo e os serviços de saúde. Foi também possível reconhecer os desafios e experiências no que respeita ao enquadramento social e legal destas questões em Portugal. De uma forma geral, os resultados demonstram experiências comuns nos diversos domínios e sistemas. As famílias relataram frequentemente dificuldades, medos e dúvidas relativamente aos cuidados de saúde, preocupação com o futuro destes/as jovens, sobretudo devido ao estigma social, e adaptação na utilização de diferentes nomes e pronomes, não só na família como na escola. Este estudo também permitiu a identificação de experiências positivas e de apoio por parte das famílias. Considerando os resultados, a equipa de investigação reflete também sobre a necessidade de desenvolver políticas públicas que visem a prestação de melhores cuidados de saúde a jovens TGGD em Portugal e ambientes escolares mais seguros, incluindo formação para profissionais de saúde, professores/as e outros intervenientes relevantes.


O CIS-Iscte junta-se à comunidade que assinala o Dia Internacional da Visibilidade Trans, 31 de março.

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